Quando se vê uma borboleta, a sensação é de leveza, liberdade e beleza à primeira vista. Mas, depois lembramos que esse inseto, por sua natureza, entra no casulo lagarta e sai uma borboleta. É a metamorfose, fenômeno que simboliza a transformação, a ressurreição para uma vida nova e gloriosa, livre de conceitos materiais e repressões. A borboleta é a humanidade frágil, representa a brevidade da vida.
Além disso, é fácil vir à mente a expressão “efeito borboleta”, denominado, em 1963, por Edward Lorenz, como um fato no qual uma borboleta, batendo suas asas na muralha da China, pode provocar uma tempestade em Nova York, ou seja, fenômenos em que um pequeno fator provoca grandes transformações são mais comuns do que se pensa.
A idéia de que na vida pequenos gestos podem resultar em grandes alterações está presente em cada instante do nosso dia-a-dia.
Entendendo dessa forma, torna-se clara e pertinente a imagem da borboleta batendo as asas nos primeiros segundos de “Por amor a uma criança”, filme de Duane Poole, dirigido por Douglas Barr, baseado no livro “Silence Broken, de Sara O’Meara.
Após a cena do bater de asas da borboleta, a tela é preenchida com a expressão angustiante do rosto de um garoto num ônibus. Ao chegar em casa, ele, tentando fugir do pai furioso, se esconde dentro e um armário de roupas. Diante desse clima de violência, a mãe tapa os ouvidos. Com medo, o garoto pega o telefone e faz uma ligação pedindo ajuda.
Do outro lado da linha, enquanto uma mulher o acalma e pede informações ao garoto, a ligação é rastreada, em 45 segundos. Quando a polícia chega a casa, os pais atendem à porta com a imagem de família feliz e diz que a ligação não passava de um trote. Mas, a polícia desconfiada, entra e se depara com o menino amarrado.
Nesse ponto, as imagens do filme levam o espectador a Tóquio, em 1959, quando novatas atrizes do cinema de Hollywood cantam para as tropas de soldados americanos durante a guerra no Vietnã.
Durante uma tempestade, as duas jovens, vestidas de branco, estão num carro que pára por causa da chuva e têm os olhares e a atenção despertados para algumas crianças sozinhas que se protegem do frio.
Para muitos, aquela cena - de crianças desabrigadas e sem agasalho, passaria despercebida, mas a reação das moças, Sara e de Yvonne, foi impulsiva e para o bem. Sem hesitar, elas vão até os pequenos japoneses e, mesmo não se entendendo pelas palavras, foi nítida a necessidade e a urgência de ajuda.
O gesto de levar as crianças para o hotel, banhá-las, dar alimento e agasalho foi natural. Era como se não houvesse alternativa. Nesse momento, o espectador pode se questionar se tomariam aquela atitude se estivesse naquela situação.
As 11 crianças eram fruto de relações de soldados americanos com japonesas. Essas amerasians - japonesas/ americanas - eram rejeitadas pelas famílias e também pelos orfanatos, pois eram crianças mestiças.
Mais uma vez, e assim é até o final do filme, o espectador é levado ao passado e trazido ao presente na seqüência. As cenas de flasback tentam mostrar a trajetória de Sara e de Yvonne, em três estágios: aos 20, aos 30 e aos 60 anos de idade. Aos poucos, pode-se notar que as 11 crianças abandonas, em 1959, foram o bater de asas da borboleta que culminou na fundação de uma organização, Childhelp USA, para prevenção, resgate e tratamento de crianças em situação de maus tratos, negligência e abandono.
De volta ao tempo atual do filme, Jacob, ainda angustiado e nervoso, é levado à organização, com a fachada “Todos que entrarem aqui encontrarão amor”. O garoto tem expressões de medo e não se sente à vontade. Sempre agarrado ao bichinho de pelúcia, olha desconfiado para tudo e para todos. Com o corpo encolhido e com o olhar vindo de baixo, ele é muito inquieto ao dormir e tem repulsa a ser coberto.
Quando ele acorda, o garotinho Michael, que dormia ao lado, vai até Jacob e conta sobre a sua mãe, que ela o deixava acender o cigarro. Quando o menino se vira para se deitar novamente, nas costas dele estava escrito com marcas de cigarro: BAD BOY.
As cenas de flashback mostram que Sara e Yvonne parecem não se conformar com a resistência em aceitar aquelas crianças. Eram apenas crianças. Foram de orfanato em orfanato em busca de cuidados e abrigo para os mestiços. Até que encontraram uma mulher, Mama Kin, que já acomodava algumas dessas crianças abandonadas. Mas não tinha nem espaço, nem recursos para mais aquelas.
Era como se o olhar de uma dissesse algo para a outra e logo a solução vinha da dupla que no dia seguinte cantava de vestidos pretos para os soldados. Durante a canção, pediam, com muito charme e alegria, ajuda para as crianças abandonadas. Todos ajudam. O coronel, ‘chefe’ delas, diz: “Vocês querem mudar o que os governos não fazem. É uma causa impossível. Contratei artistas e não assistentes sociais”. As garotas perguntam ao coronel: “O que faria se fossem seus filhos?”.
Em seguida, são caminhões estacionando e os soldados descarregando sacos de alimentos no abrigo da Mama Kin. Assim, ficou clara a idéia de tratar aquelas crianças como se fossem seus filhos.
Anos passaram. Em 1978, Sara e Yvonne estão negociando espaço para a instituição, com o Bispo O’Connor que aceita vender o terreno por U$1,800 milhões.
A partir daí, as histórias se encontram. A Childhelp ganha prioridade na trama. O foco agora é a organização – a trajetória das garotas dá lugar ao desenvolvimento do trabalho da equipe que no dia-a-dia cuida e luta pela vida em segurança de crianças ali abrigadas.
O espectador, nesse instante, assim como o personagem Jacob, toma conhecimento de que ele e o seu companheiro de quarto não são os únicos a sofrer com a violência dos pais.
Laura é uma menina que tem uma cicatriz do lado direito do rosto – o sinal foi provocado por uma navalha nas mãos do namorado da mãe, Jonhny. Laura usa tintas vermelhas em seus quadros. O que parece ser um auto-retrato: um rosto azul com lágrimas e um símbolo . Quando Laura vê a água saindo da torneira, ela diz ”não me obrigue”. Jonhny, que cumpre 10 meses de prisão, a colocava na banheira com água bem quente e a trancava no armário.
A mãe da garota vai visitá-la e a quer de volta. Não é o desejo de Laura, mas ela se preocupa com a irmãzinha que pode precisar dela quando Jonhny sair da cadeia. Mesmo assim, tem consciência de que ainda não está preparada. É uma criança adulterada pelas experiências negativas. Outro ponto é a cicatriz, que ela diz que saberá hora de retirá-la, quando conversa com sra. Graysson.
Essa, por sua vez, também tem espaço no filme. Quando ela chega em casa, do trabalho da Childhelp, se depara sempre com o seu conflito com a filha adolescente que menospreza a ajuda promovida às crianças, chamando-as de retardadas. Derruba algumas folhas no chão, ao pegar a garota se sensibiliza com os desenhos feitos pelas crianças.
Os pais de Jacob vão à Childhelp para buscá-lo. Sara e Yvonne não permitem. Nessa noite, Jacob foge da instituição, mas o rapaz (quase morto duas vezes pela mãe alcoólatra) que cuida do rancho e dos animais vai buscá-lo. Compreende a fuga, e sabe que é por causa da visita dos pais, Jacob não quer voltar para casa.
Jacob, que fala só em 3ª pessoa, enterra um bonequinho. Logo é percebido algum trauma. Quando investigam o quintal da família dele, cavam e encontram um pé do tênis do menino. Jacob conta que o pai dele o havia enterrado e dado um canudo para ele respirar.
Essa foi a justificativa para mandar prender os pais de Jacob e eliminar a chance de ele tê-lo de volta um dia.
“Por Amor a uma Criança” chega ao fim do segundo estágio com Sara e Yvonne apreensivas com a decisão de Laura, já sem a cicatriz, voltar para casa e com Michel tendo retornado à mãe. Com o sentimento de impotência e de insegurança também estava Graysson. Elas temem que as crianças não fiquem seguras, sem o apoio e a proteção da Childhelp.
Na manhã seguinte, a notícia da morte da Michael chega à instituição. A sensação é de culpa. Sara e Yvonne se confortam e tentam não se sentirem culpadas por terem deixado o garotinho ir embora.
As duas horas de filme terminam com Jacob adulto, cursando medicina e trabalhando pela organização que partiu num bater de asas de borboletas em Tóquio e que salvou mais de 3 milhões de crianças nos Estados Unidos e Canadá.
Assinar:
Postar comentários (Atom)

Nenhum comentário:
Postar um comentário